quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Clarice


Certas noites ela saia para correr. Noutras, flertava com meia dúzia de estrelas selecionadas em diferentes constelações para evitar o ciúme. Nalgumas, corria com os cães da praça uivando para os prédios que a lua usava como escudo. Muitas vezes, escondia seus pensamentos numa garrafa que enterrava atrás da casa. Pobre garrafa esverdeada com o marrom decorando seu exterior, era preferível que tudo fosse o interior, branco e preto, branco e azul, sempre salpicado de sangue!.
Durante os dias, fitava os pés, alma vazia, olhos negros como os dizeres dentro do vidro aos pés da árvore do quintal. Sobreviver aos chefes, aos memorandos, aos trins, aos trens, às baldeações, aos sorrisos pardos... Um grande tudo que não lhe dizia nada. Quem a olhasse veria o cabelo preso, a blusa branca, o crachá e só! Afinal, Clarice tinha a alma escura, esverdeada, coberta de marrom.